Amsterdão, Bogotá, Copenhaga e Curitiba. Para além de cobrirem as primeiras letras do alfabeto estas quatro cidades têm algo de muito especial. Todas elas são repetidamente apresentadas como modelos de sucesso no que diz respeito à mobilidade dos cidadãos bem como à qualidade de espaços que permitem o convívio e usufruto por parte dos seus utilizadores.
Como é que cidades de países com costumes e níveis de desenvolvimento tão distintos podem estar tão próximas na relação entre as mesmas e os cidadãos? A resposta é extremamente simples e reside nas políticas de transporte e de planeamento, adoptadas durante os anos 70, em todas elas. Por razões distintas verificou-se que nestas cidades havia um problema de mobilidade, estando todas elas, como qualquer cidade moderna, maioritariamente vocacionadas para o uso do automóvel como meio de transporte principal dos seus cidadãos. Tal como em todas as cidades modernas, nestas cidades existiam problemas graves de congestionamento automóvel, falta de estacionamento e dificuldades de mobilidade por parte de não utilizadores de automóvel. Em Amsterdão, a adicionar a estes problemas surgiu igualmente um problema de aumento radical de acidentes mortais, sendo grande parte das vítimas crianças. A fim de inverter esta situação houve, há cerca de quatro décadas, uma mudança radical nas políticas de transporte. Nas duas cidades europeias essa mudança foi imposta por protestos massivos por parte dos cidadãos, enquanto nas duas cidades latino-americanas essa mudança foi introduzida por parte de governantes com visão.
Em vez de se demolirem edifícios para alargamento de ruas, ou de se transformarem parques e jardins em estacionamentos automóveis, melhorando as condições para a mobilidade automóvel, nestas cidades optou-se por fazer o inverso e deixou de se privilegiar o uso deste meio de transporte. Faixas de circulação automóvel foram transformadas em faixas para transportes públicos, bem como em faixas de circulação para bicicletas. Os passeios foram aumentados através da redução do estacionamento automóvel, e nos centros históricos o acesso automóvel passou a ser altamente condicionado. O resultado destas medidas foi um súbito aumento do uso dos transportes públicos e principalmente da bicicleta como meio de transporte. Em Amsterdão e Copenhaga, cerca de 35% das pessoas utiliza a bicicleta como meio de transporte entre casa e trabalho, número que aumenta para 50% se se considerarem apenas as deslocações para outras actividades, como ir às compras ou a ocupação dos tempos livres.
A bicicleta permite uma deslocação de porta a porta, sem problemas de estacionamento, sem custos de deslocação e baixos custos de manutenção, permitindo fazer exercício físico ao mesmo tempo que nos deslocamos. A juntar a todas estas vantagens, lembro que o uso da bicicleta não emite gases de efeito de estufa, sendo, assim, um meio de transporte ecológico. Infelizmente o uso da bicicleta está, ainda, associado a classes sociais mais baixas, devido ao seu baixo custo, contrariamente ao automóvel, que continua a ser um símbolo de estatuto económico. No entanto, esta mentalidade está aos poucos a mudar e é possível ver, em cada vez mais cidades, tal como em Amsterdão, Bogotá, Copenhaga e Curitiba, pessoas de todas as idades, credos ou classes sociais a utilizarem a bicicleta como meio de transporte.
Tal como no início do século XX, quando a bicicleta permitiu uma maior autonomia às mulheres, impulsionando em parte as lutas pela igualdade de géneros, no início do século XXI a bicicleta permitirá melhorar a mobilidade da generalidade dos cidadãos e reduzir a desigualdade social e o isolamento pessoal provocados pelo automóvel. O futuro das cidades passa pela restrição do uso do automóvel e pela implementação de meios que permitam a mobilidade pessoal não poluente e não invasiva.
A mudança já começou.
E tu, vais ficar a ver passar as bicicletas?
nota: este artigo foi publicado na edição nº 71 do FAZENDO.
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