sexta-feira, 11 de maio de 2012
I cycle in horta
terça-feira, 10 de abril de 2012
Horta: a cidade dos automóveis
Na última edição do FAZENDO foram apresentadas quatro cidades onde a utilização do automóvel deixou de ser prioritária e em que outras formas de mobilidade ganharam mais protagonismo, sendo a bicicleta um dos meios de transporte mais populares nas referidas cidades. Tal como então referi, as principais causas para essa mudança foram os problemas relacionados com o excesso de tráfego automóvel, nomeadamente o congestionamento, a falta de estacionamento, e um elevado número de acidentes graves.
Na Horta não existem estes problemas, uma vez que acidentes graves no centro da cidade são praticamente inexistentes, raramente é necessário estacionar a mais de 500m do local onde queremos ir, e não existe qualquer condicionamento à circulação automóvel. Qualquer condutor poderá ir a qualquer ponto da cidade a qualquer hora e sem ter de se preocupar com o tempo que demora a chegar, porque simplesmente não há congestionamentos ou “horas de ponta”. O que nos leva a colocar esta questão: se não há problemas de trânsito, porque é que se deve mudar alguma coisa? A razão é óbvia e prende-se com o facto de esta facilidade de mobilidade por parte dos automóveis ser feita à custa da dificuldade das restantes formas de mobilidade.
Qualquer peão conhece as dificuldades de circular a pé na cidade e consegue facilmente imaginar o quão difícil deve ser a deslocação diária por parte de pessoas idosas, pessoas com mobilidade condicionada, pessoas com carrinhos de bebé ou com uma criança pela mão. Não é por acaso que o mercado e o hipermercado são dos poucos sítios em que as pessoas param para conversar com alguém que encontrem ocasionalmente, enquanto fazem as suas compras. Nesses locais podem parar descontraidamente sem correr o risco de serem atropeladas e sem causar problemas de circulação às outras pessoas devido à exiguidade dos passeios. É esse ambiente que se deseja no interior das cidades, locais para os cidadãos se poderem encontrar, parar, conversar.
É por esta razão que diversas ruas da Horta deveriam ter acesso automóvel condicionado, sendo possível circular apenas veículos autorizados (moradores, taxis, camiões do lixo, veículos prioritários, etc). A primazia do automóvel nas políticas de mobilidade na cidade da Horta foi levada a pontos extremos, estando patente nas diversas ruas em que existe estacionamento automóvel em vez de passeios (Rua Nova, Rua de São Paulo, Rua de São João, Rua de Jesus, só para citar algumas), e obrigando os peões a circularem em estado de alerta e a recolherem-se entre os carros estacionados de cada vez que passa outro veículo. A solução passa pela interdição de estacionamento nas ruas sem passeios, ou em que os mesmos sejam estreitos (menos 1,5m de largura), de forma criar condições de circulação pedonal com segurança.
Naturalmente que esta solução diminuirá a actual facilidade de estacionamento mas, em contrapartida, resolverá os problemas de mobilidade individual dos cidadãos, mobilidade essa que, ao contrário do estacionamento automóvel particular, é um direito previsto na lei (Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de Agosto).
Em Curitiba e Bogotá a mudança foi feita por políticos com visão. Em Amsterdão e Copenhaga a mudança foi feita por exigência dos cidadãos. E na Horta, como será?
(Este artigo foi publicado na edição nº 73 do FAZENDO. Ilustração de Tomás Silva)
terça-feira, 7 de fevereiro de 2012
a bicicleta e o futuro das cidades.
Amsterdão, Bogotá, Copenhaga e Curitiba. Para além de cobrirem as primeiras letras do alfabeto estas quatro cidades têm algo de muito especial. Todas elas são repetidamente apresentadas como modelos de sucesso no que diz respeito à mobilidade dos cidadãos bem como à qualidade de espaços que permitem o convívio e usufruto por parte dos seus utilizadores.
Como é que cidades de países com costumes e níveis de desenvolvimento tão distintos podem estar tão próximas na relação entre as mesmas e os cidadãos? A resposta é extremamente simples e reside nas políticas de transporte e de planeamento, adoptadas durante os anos 70, em todas elas. Por razões distintas verificou-se que nestas cidades havia um problema de mobilidade, estando todas elas, como qualquer cidade moderna, maioritariamente vocacionadas para o uso do automóvel como meio de transporte principal dos seus cidadãos. Tal como em todas as cidades modernas, nestas cidades existiam problemas graves de congestionamento automóvel, falta de estacionamento e dificuldades de mobilidade por parte de não utilizadores de automóvel. Em Amsterdão, a adicionar a estes problemas surgiu igualmente um problema de aumento radical de acidentes mortais, sendo grande parte das vítimas crianças. A fim de inverter esta situação houve, há cerca de quatro décadas, uma mudança radical nas políticas de transporte. Nas duas cidades europeias essa mudança foi imposta por protestos massivos por parte dos cidadãos, enquanto nas duas cidades latino-americanas essa mudança foi introduzida por parte de governantes com visão.
Em vez de se demolirem edifícios para alargamento de ruas, ou de se transformarem parques e jardins em estacionamentos automóveis, melhorando as condições para a mobilidade automóvel, nestas cidades optou-se por fazer o inverso e deixou de se privilegiar o uso deste meio de transporte. Faixas de circulação automóvel foram transformadas em faixas para transportes públicos, bem como em faixas de circulação para bicicletas. Os passeios foram aumentados através da redução do estacionamento automóvel, e nos centros históricos o acesso automóvel passou a ser altamente condicionado. O resultado destas medidas foi um súbito aumento do uso dos transportes públicos e principalmente da bicicleta como meio de transporte. Em Amsterdão e Copenhaga, cerca de 35% das pessoas utiliza a bicicleta como meio de transporte entre casa e trabalho, número que aumenta para 50% se se considerarem apenas as deslocações para outras actividades, como ir às compras ou a ocupação dos tempos livres.
A bicicleta permite uma deslocação de porta a porta, sem problemas de estacionamento, sem custos de deslocação e baixos custos de manutenção, permitindo fazer exercício físico ao mesmo tempo que nos deslocamos. A juntar a todas estas vantagens, lembro que o uso da bicicleta não emite gases de efeito de estufa, sendo, assim, um meio de transporte ecológico. Infelizmente o uso da bicicleta está, ainda, associado a classes sociais mais baixas, devido ao seu baixo custo, contrariamente ao automóvel, que continua a ser um símbolo de estatuto económico. No entanto, esta mentalidade está aos poucos a mudar e é possível ver, em cada vez mais cidades, tal como em Amsterdão, Bogotá, Copenhaga e Curitiba, pessoas de todas as idades, credos ou classes sociais a utilizarem a bicicleta como meio de transporte.
Tal como no início do século XX, quando a bicicleta permitiu uma maior autonomia às mulheres, impulsionando em parte as lutas pela igualdade de géneros, no início do século XXI a bicicleta permitirá melhorar a mobilidade da generalidade dos cidadãos e reduzir a desigualdade social e o isolamento pessoal provocados pelo automóvel. O futuro das cidades passa pela restrição do uso do automóvel e pela implementação de meios que permitam a mobilidade pessoal não poluente e não invasiva.
A mudança já começou.
E tu, vais ficar a ver passar as bicicletas?
nota: este artigo foi publicado na edição nº 71 do FAZENDO.